Entrevista exclusiva da Professora Valdirene do Carmo Ambiel ao Blog Monarquia Já sobre a exumação dos despojos do Imperador Dom Pedro I e das Imperatrizes Dona Leopoldina e Dona Amélia
Ela ajudou a recontar parte da História do
Brasil. Historiadora, especializada em Arqueologia, a Professora Valdirene do
Carmo Ambiel acaba de concluir seu mestrado sobre a exumação dos despojos do
Imperador Dom Pedro I e das Imperatrizes Dona Leopoldina e Dona Amélia. O
brilhantismo de seu trabalho atraiu os olhares da mídia curiosa e, o que já era
sabido para os monarquistas, passou a ser notícia em todos os meios de
comunicação do país, sendo manchete também na Europa, Estados Unidos e China. A
Professora Valdirene concedeu entrevista exclusiva ao Blog Monarquia Já para contar um pouco mais sobre as pesquisas:
BMJ - Professora Valdirene, em nome dos
leitores, colaboradores e da equipe de edição, o Blog Monarquia Já agradece a franca disponibilidade em conceder
esta entrevista.
Professora
Valdirene -
Obrigada pelo apoio!
BMJ - Por que pesquisar a cripta do
Monumento à Independência, no Ipiranga, e exumar os corpos do Imperador e das
Imperatrizes?
Professora
Valdirene -
Como os senhores já devem ter visto na imprensa, o local sofre com infiltração
de água, já há muito tempo. Eu nasci poucos quarteirões do local e passei minha
infância brincando no local. Quando o corpo da Imperatriz Dona Amélia chegou,
eu estava entre as pessoas que aguardavam, na época eu tinha 11 anos. Logo, eu
via os problemas e temia que esta umidade afetasse os remanescentes humanos, de
forma que pudéssemos perdê-los para sempre. Quando tive a oportunidade de
apresentar meu projeto de mestrado no MAE/USP, pensei em fazer algo sobre isso,
mesmo porquê, meu TCC em História havia sido sobre a participação política de
Dona Leopoldina no processo de Independência do Brasil.
BMJ - Quando começaram os trabalhos de pesquisa
e porque a necessidade do sigilo?
Professora
Valdirene -
As pesquisas na Cripta ou Capela Imperial começaram em fevereiro de 2012, mas
as pesquisas bibliográficas e nos documentos históricos começaram em 2007.
O sigilo foi porquê nós não tínhamos nada
para dizer. É possível que as dúvidas da imprensa fossem as mesmas que nós
tínhamos. Por isso, optamos por falar quando tivéssemos algo a dizer.
BMJ - Como a Família
Imperial recebeu o pedido da exumação dos despojos Imperais?
Professora
Valdirene
- Eu já conhecia Dom Luiz e Dom Bertrand desde quando fiz as pesquisas para
minha graduação. Acredito ter transmitido confiança aos Príncipes, porém, eu
passei como todo o trabalho seria feito. É claro que não pensava que contaria
com as tomografias e análises do Instituto de Física. O mesmo material foi
enviado a Dom Pedro Carlos, devo dizer que os Príncipes tiveram a atitude digna
de descendentes de Dona Leopoldina.
Contei com o apoio de uma pessoa do Pró Monarquia
que se transformou em um Grande Amigo: Gustavo Cintra do Prado.
A professora Valdirene falou aos monarquistas sobre seus trabalhos no Encontro Monárquico do Rio de Janeiro, em julho de 2012
BMJ - Sabe-se que o Príncipe Imperial do
Brasil, Dom Bertrand de Orleans e Bragança, representando seu irmão, Dom Luiz,
Chefe da Casa Imperial, acompanhado de sua assessoria e de membros do Instituto
Pró Monarquia, fizeram inúmeras visitas a cripta. Que outros membros da Família
Imperial estiveram lá?
Professora
Valdirene
- Basicamente só eles.
BMJ - Uma benção
antecedeu a abertura dos sarcófagos, descendestes dos Imperadores estavam lá.
Apesar de ser, para a equipe de profissionais e para a Senhora como
pesquisadora, um evento científico, como foi a emoção de ver os restos mortais
daqueles vultos históricos que garantiram ao país a independência, a
nacionalidade e a identidade brasileira?
Professora
Valdirene
- Não posso dizer que não sou admiradora de Dona Leopoldina, não só pelo lado
político, mas por tudo que ela fez pela Ciência em nosso país. Tive a
oportunidade de “reconhecer” a figura de Dom Pedro I (que merece uma releitura)
e também o enorme prazer de conhecer a figura fantástica de Dona Amélia. Para
mim, a sensação foi de uma admiradora vendo seu ídolo, algo emocionante, pois
eles não eram mais páginas de livros, nós tivemos a certeza que eles eram seres
humanos e tiveram uma vida como nós temos a nossa hoje. Isso faz com que o respeito,
que já não era pouco, aumente ainda mais.
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Para
mim, a sensação foi de uma admiradora vendo seu ídolo, algo emocionante, pois
eles não eram mais páginas de livros, nós tivemos a certeza que eles eram seres
humanos e tiveram uma vida como nós temos a nossa hoje. Isso faz com que o
respeito, que já não era pouco, aumente ainda mais.
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A celebração que antecedeu a abertura dos ataúdes
Foto: divulgação
BMJ - Quais foram os procedimentos
executados nos corpos do Imperador e das Imperatrizes?
Professora
Valdirene
- Cada um teve um procedimento diferente, pois seu estado era diferente:
a) Dona Leopoldina estava com o corpo
esqueletizado. Sua urna funerária havia sido substituída na segunda metade da
década de 1980, por isso não foi necessária a troca, pois estava bem preservada.
As vestes (de gala Imperial) estavam preservadas, mas em situação frágil,
natural pelo tempo. Como tivemos as imagens da tomografia para analisar os
ossos e a própria roupa, não foi necessária uma decapagem arqueológica mais
intensa que poderia comprometer as vestes.
b) Os remanescentes humanos de Dom Pedro I
estavam nas urnas que o trouxeram de Portugal, em 1972: o corpo em um caixão de
madeira rudimentar (tradição da época, séc.XIX), dentro de uma 'placa de
chumbo' que aparece nas bibliografias como caixão de chumbo. Estas duas urnas,
no caso, estavam dentro de um grande ataúde, feito de pinho português, com um
crucifixo e as coroas de Portugal e Brasil (o que mostra que era realmente de
1972, e não de 1834).
A urna que abrigava o corpo estava totalmente
comprometida, o que nos obrigou a fazer a decapagem arqueológica total, ou
seja, retirar todo o conteúdo da urna e colocar em uma outra para o exame de
tomografia.
Após o exame, a urna que abriga o corpo foi
substituída, por outra também de madeira rudimentar, mas o fundo foi forrado
com tecido de puro linho branco, material usado para preservação de despojos
humanos desde a antiguidade. Esta urna foi colocada dentro do caixão de pinho
português.
c) Dona Amélia estava com o corpo sem
sedimentos, não foi necessária a decapagem arqueológica. E seu corpo estava
preservado. Só nos restava levá-lo para tomografia, onde vimos que a
preservação também foi dos órgãos internos.
As urnas de Dona Amélia (madeira, chumbo e
esquife) foram substituídas, pois apesar de resistir e preservar o corpo por 30
anos, apresentavam sinais de desgaste. Logo, compramos uma nova urna, como as
que são usadas para longos traslados, com zinco no lugar do chumbo. Foi feito
um trabalho de preservação no corpo, que chamamos de reembalsamamento, que visa
preservar o corpo da ação de micro-organismos. O mesmo procedimento foi
aplicado na urna.
BMJ - Depois de aberto os ataúdes,
verificou-se que o corpo da Imperatriz Dona Amélia está praticamente intacto. A
que se atribui este fenômeno?
Professora
Valdirene
- Ainda estamos fazendo exames, mas é possível que seja pelo fato da urna ter
sido hermeticamente fechada em 1873 e pelo mesmo cuidado ter sido feito em
1982.
Encontramos uma incisão na região da jugular,
este procedimento foi feito após a morte, acreditamos que tenha sido para
preservar o corpo para os funerais que demoravam em torno de 3 dias. Como o
corpo foi hermeticamente fechado, como afirmamos, é possível que as ações
responsáveis pela decomposição tenham sido anuladas, preservado o corpo. Ou
seja, foi acidental.
BMJ - De acordo com os exames realizados,
as características físicas de Dom Pedro I e Dona Leopoldina, que as pinturas,
alegorias e a historiografia transmitiram, remetem a realidade?
Professora
Valdirene
- Só teremos certeza disso em meu doutorado, quando análises mais precisas
serão feitas com base nas tomografias. Mas, em um exame superficial, é possível
notar que Dona Leopoldina possuía uma ossatura fina, característica de uma
mulher não muito robusta. Acreditamos que ela tenha sido retratada desta forma
pelo número de gestações que teve, e quase que sucessivas, além dos problemas
com o clima do Rio de Janeiro, para alguém de um ambiente frio pode trazer
certos problemas. No caso da estatura de Dom Pedro, um homem com estatura entre
1,66m e 1,73m não pode ser considerado baixo, inclusive até bem pouco tempo
atrás.
BMJ - Sobre Dona Leopoldina, o Príncipe
Dom Bertrand, na qualidade de descendente direto dos Imperadores, destacou em
entrevistas que “ao contrário do que informam os historiadores malévolos, ela
não morreu porque recebeu um pontapé do marido. A pesquisa prova que o aborto
que sofreu foi espontâneo e a morte dela não foi decorrente de nenhuma
violência”. A Senhora, como historiadora, como vê esta nova realidade da
História?
Professora
Valdirene
- O que eu fiz foi buscar informações em fontes primárias (documentos da
época), seja no IHGSP ou no Museu Imperial. Passei os laudos médicos para o Dr.
Luiz R. Fontes (ginecologista/obstetra e legista), pois, eu sou historiadora e
arqueóloga. Tenho condições de ler estes documentos, mas não de interpretá-los.
Eu cheguei a esta conclusão com base nestas análises. Porém, como historiadora,
não posso acreditar em verdades absolutas, mas em versões com base nas fontes
que usei. Se amanhã alguém tiver acesso a documentos e análises que provem
contrário, podemos discutir sobre isso.
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Foi
feito um acordo para que o Museu Imperial lance minha tese, com outros dados
inseridos. Espero que isso aconteça ainda este ano. Há também a intenção de
fazer um documentário, mas neste caso precisamos de patrocínio, pois os gastos
são muito grandes.
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BMJ - Dom Pedro I e Dona Leopoldina estavam
totalmente descompostos, Dona Amélia estava intacta. O que foi feito das
vestimentas que os Imperadores usavam?
Professora
Valdirene
– Sobre Dona Leopoldina, como afirmei acima, nós não mexemos nas vestes apenas
coletamos amostras para análises.
Dom Pedro estava com as vestes, inclusive
botas, totalmente fragmentados, sem condições para restauro. Nós recolhemos
este material para análises do nosso trabalho também.
Dona Amélia estava com as vestes intactas,
logo, pegamos pequenos fragmentos para análises. Mesmo no processo de
reembalsamamento as vestes da Imperatriz não foram mexidas, pois como houve um
tratamento na urna, este procedimento seria absorvido pelas vestes, não
havendo, portanto necessidade de retirá-las. Eu mesma apliquei esta substância
nas mãos, pés e rosto da Imperatriz. A urna de zinco foi soldada, da mesma
forma que em 1982.
BMJ - Dona Amélia foi recolocada ao
sarcófago como foi exumada, ou seja, intacta e com suas vestes?
Professora
Valdirene
- Bem, esta pergunta já foi respondida. Apenas para confirmar, em nenhum
momento as Imperatrizes foram desprovidas de suas vestes e é claro, continuam
com as mesmas em seus ataúdes.
BMJ - Há riscos de deterioração dos
despojos de Dona Amélia depois de ter saído de um ambiente hermético e ter sido
exposta ao ar e possíveis invasores?
Professora
Valdirene
- Com o tratamento que fizemos e com o monitoramento semanal que está sendo
realizado por mim mesma, com a permissão do DPH (da Prefeitura de São Paulo),
não, porquê se houver um sinal de deterioração, pois pode haver alguma
deterioração no zinco, nós logo saberemos e tomaremos as medidas necessárias. O
Serviço de Verificação de Óbitos da Capital - SP (FMUSP), está me auxiliando
neste trabalho.
BMJ - Recolhidos os fragmentos das
vestimentas Imperiais, as ordens honoríficas e as joias, para onde foram encaminhas
e o que se planeja fazer com os objetos?
Professora
Valdirene
- As comendas, brincos, botões e um fragmento do manto da Imperatriz Dona
Leopoldina foram entregues ao Museu da Cidade de São Paulo, órgão ligado ao
DPH. Nós não sabemos quando serão expostos ao público, pois agora cabe ao DPH e
Secretaria da Cultura do Município de SP.
Porém, como as análises feitas nos fragmentos
foram as não destrutivas, realizadas pela equipe da Prof.ª Dra. Márcia Rizzutto
do Instituto de Física da USP, nós pretendemos doar este material ao Museu
Imperial, para que seja exposto ao público e analisado pelas gerações futuras.
O Museu Imperial já está em contato com o IPHAN para verificação dos trâmites
para esta doação.
BMJ - Matérias de jornais famosos e
revistas conceituadas informam que as pesquisas não vão parar. Quais os outros
objetivos que a equipe de pesquisa tem e o que será possível fazer com os dados
coletados?
Professora
Valdirene
- Ainda não fizemos nada. Temos que processar todos os dados coletados nas
pesquisas de campo. Este trabalho fará parte do meu doutorado.
BMJ - A Senhora apresentou sua defesa de
mestrado com o título “Estudos de arqueologia forense aplicados aos
remanescentes humanos dos primeiros imperadores do Brasil depositados no
monumento à independência”, no Museu de Arqueologia e Etnologia – MAE, da USP,
no último dia 18 de fevereiro. Como a banca recebeu este título e que
considerações podem ser feitas sobre o trabalho?
Professora
Valdirene
- Não houve problema com a banca, pois foi isso que ocorreu. Eu usei muitos
métodos forenses, como por exemplo, para estabelecer as estaturas e a questão
de fraturas. Entretanto, foi um trabalho de Arqueologia Histórica, por isso o
título: "Estudos de Arqueologia Forense Aplicados...", mas não foi um trabalho
tradicionalmente forense.
BMJ - Depois de um brilhante trabalho,
com grandes elogios dos Príncipes da Casa Imperial Brasileira, sendo alvo de
manchetes de jornais e revistas do Brasil e do mundo e ajudando a recontar
parte da História do Brasil, como a Senhora vê todo este sucesso e a
repercussão?
Professora
Valdirene
- Não estou muito acostumada com a imprensa... Mas entendo que foi um
importante passo para nossa história, além de uma dose de ânimo aos nossos
historiadores e arqueólogos. O que fiz com este trabalho foi lançar novas
abordagens aos meus colegas. Nós, da área das Ciências Humanas, devemos
produzir conhecimento, assim como toda Ciência, e não só reproduzir.
O caso dos Príncipes, eles me deram muita
força durante todo o trabalho, inclusive quando minhas pernas e braços
fraquejaram. Devo muito a eles.
BMJ - A Senhora planeja lançar alguma
obra, quem sabe um livro, de alcance popular, servindo também como base de
pesquisa?
Professora
Valdirene
- Sim, neste final de semana dei uma palestra no Museu Imperial, onde foi feito
um acordo para que o Museu Imperial lance minha tese, com outros dados
inseridos. Espero que isso aconteça ainda este ano. Há também a intenção de
fazer um documentário, mas neste caso precisamos de patrocínio, pois os gastos
são muito grandes.
BMJ - Infelizmente quase nada se fala e
pouco se pesquisa sobre nossos verdadeiros personagens históricos. Dona
Leopoldina e Dona Amélia permanecem ilustres desconhecidas para muitos
Brasileiros. A Senhora acha que com este belo trabalho, pode-se abrir
precedentes para novas pesquisas sobre o Império?
Professora
Valdirene
- Espero que sim, mas terá que ser uma pesquisa séria, a História tem que ser
vista como Ciência que ela é e não romance como vemos em muitas publicações nos
últimos anos.
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A
História tem que ser vista como Ciência que ela é e não romance como vemos em
muitas publicações nos últimos anos.
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Professora
Valdirene
- A vontade de começar a nova etapa.
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