Beato Carlos e Serva de Deus Zita da Áustria
Um casal que muito tem a ver com a Família Imperial Brasileira, seja pelo parentesco ou pela recente notícia da sugestão do início do processo de beatificação de Dona Isabel, o Imperador Carlos da Áustria – Beato da Igreja – e a Imperatriz Zita – Serva de Deus, completou, no último dia 21 de outubro, 100 anos de união, data em que a Santa Sé determinou como sendo a festiva do Beato Carlos. Um casal unido no amor, nos valores familiares, na vida de Estado, mas principalmente na fé cristã.
Ele, nascido em 1887, na Áustria, filho do Arquiduque Otto e da Arquiduquesa Maria Josefa, o Beato Carlos era sobrinho de Francisco José, Imperador da Áustria e Rei da Hungria. Nasceu afastado da linha de sucessão, pois o Imperador, seu tio, possuía descendência que lhe garantia continuidade, contudo o Império dos Habsburgo se viu transtornado pelas tragédias que culminaram na I Grande Guerra, fazendo com que mais tarde Carlos fosse Imperador. O Arquiduque Herdeiro Francisco Ferdinando foi assassinado e o Arquiduque Carlos passou a ser o Herdeiro Presuntivo do Trono. Fez carreira militar e desde criança já era conhecido pela boa educação e dedicação ao próximo.
Ela, nascida em 1892 na Toscana, filha do Duque Roberto de Parma e da Duquesa Maria Antonia de Bragança, educada privativamente sob os auspícios da tradição monárquica e da fé católica, tendo contato fraterno com diversas ordens religiosas – sobretudo com a beneditina, a Imperatriz Zita era membro de uma família peculiar, tendo 23 irmãos, entre eles 6 excepcionais. Seu pai foi o último Duque Soberano de Parma.
Em 1911, precisamente a 21 de outubro, as vidas do então Arquiduque Carlos e da Princesa Zita se entrelaçaram, formando o casal exemplo de vida e fé que hoje reúne milhares de devotos.
Em imagem da LUCE, no casamento do Beato Carlos e da Serva de Deus Zita da Ásutria, vê-se o Príncipe Dom Luiz e a Princesa Dona Maria Pia de Orleans e Bragança, representando a Família Imperial do Brasil
O casamento de primos Carlos e Zita foi festejado e querido por todos (tendo inclusive a presença do Príncipe Dom Luiz e da Princesa Dona Maria Pia de Orleans e Bragança, Príncipe e Princesa Imperais do Brasil). Em 24 de junho de 1911, portanto antes do casamento, e até antes mesmo de Carlos se tornar o Herdeiro Presuntivo, Zita foi recebida por São Pio X, Papa da época, que lhe concedeu audiência particular onde revelou: “Vossa Alteza vai se casar com o Herdeiro do Trono. Desejo-lhe, então, a plenitude das bênçãos. E eu me alegro infinitamente com isso, pois Carlos é um presente do céu por tudo o que a Áustria fez pela Igreja”. A então Princesa, perturbada com as revelações, pensou em contrariar Sua Santidade e afirmar que o Arquiduque Carlos não era o Herdeiro, contudo respeitou a colocação do Santo Padre. Na verdade, as sábias palavras de São Pio X foram profecias sobre o futuro do casal e a confirmação do que Carlos representava através de sua bondade e fé, um presente para a Áustria.
O casal teve oito filhos, os Arquiduques: Otto, Adelaide, Roberto, Felix, Carlos Luís, Rodolfo, Carlota e Elisabete.
Em 21 de novembro de 1916, Carlos tornou-se, com o falecimento do tio, Imperador da Áustria e a 30 de novembro do mesmo ano, Rei da Hungria, seus títulos eram: Sua Majestade Imperial, Real e Apostólica Carlos I, pela Graça de Deus, Imperador da Áustria, Rei Apostólico da Hungria, quarto de seu nome, Rei da Boêmia, Dalmácia, Croácia, Eslovénia e Galícia, Lodomeria e Ilíria; Rei de Jerusalém, etc... Arquiduque da Áustria, Grão Duque de Toscana e Cracóvia, Duque de Lorena e Salzburgo, de Estiria, Caríntia, Carniola e Bucovina; Grão Príncipe da Transilvânia; Margrave da Morávia; Duque da Alta e da Baixa Silésia, de Módena, Parma, Piacenza e Guastalla, de Auschwitz e Zator, de Teschen, Friuli, Ragusa e Zara; conde de Habsburgo e Tirol, de Kyburg, Gorízia e Gradisca; Príncipe de Trento e Brixen; Margrave da Alta e da Baixa Lusacia e da Ístria; Conde de Hohenems, Feldkirch, Bregenz, Sonnenberg, etc...; Senhor de Trieste, de Cattaro, e de Marca Wendia; Grão Voivoda da Sérvia, etc. e, consequentemente, Zita se torna a Imperatriz e Rainha. Foram dois anos de reinando, onde o Imperador pode provar das mais tristes realidades no governo. No auge da I Grande Guerra, o Imperador Carlos preocupou-se avidamente em solucionar a problemática, arquitetando secretos tratados de Paz com governos europeus, no entanto não obteve êxito. Enquanto seu marido se preocupava em acabar com a terrível guerra, a Imperatriz Zita cuidava em assistir os desvalidos. Criou, para tanto, obras de caridades subsidiadas por ela mesma e por amigos valorosos.
Sob a voz do nacionalismo, pressionado por alguns, o Imperador Carlos teve de deixar seus sonhos de restauração da dignidade do Império Austro-húngaro e em 11 de novembro de 1818 renunciou sem abdicar do Trono. O Imperador e a Família se recolheram em uma propriedade em Viena e logo depois foram banidos, passando pela Suíça e depois indo viver na Ilha da Madeira. Neste período com sete dos oito filhos (a Imperatriz estava grávida do oitavo), passaram por toda a privação possível, desde a escassa comida até o frio intenso. Sem recursos necessários para se hospedarem em hotéis, foi lhes emprestada uma casa e pelo relato da camareira da Imperatriz, pode se ver o quão grande era sacrificante a vida que levavam: “Na verdade, não tivemos senão três dias com sol. Durante o resto do tempo, sempre chuva, nevoeiro e umidade. Faz frio nestas montanhas. Aqui, não temos luz elétrica; água corrente, apenas no primeiro andar e na cozinha, que fica na parte térrea da casa (...). Para aquecimento, temos apenas lenha verde que fumega constantemente. Só podemos lavar a roupa com água fria e sabão. (...) A casa é tão úmida que cheira a mofo e pode-se ver o hálito da respiração de cada um. Os únicos meios de transporte são os carros ou os bois, mas não podemos pagar a nenhum deles. Além disso, existe também um funicular, que não funciona todos os dias. A pé não se pode descer do Monte, pois seria necessário quase que um dia inteiro para voltar. O pobre Imperador não pode ter carne à mesa para o jantar, mas somente legumes e alguma sobremesa. É o que nos causa maior pena. Para nós, isso não tem problema, não nos faz falta. Mas para eles... não têm sequer o suficiente para comer. (...) O pior de tudo é que Sua Majestade deve ter seu bebê no mês de maio e não há planos de chamar nem uma parteira, nem um médico para assisti-la. Por aqui, há apenas uma pajem de crianças, mas sem a necessária experiência. Então, não teremos sequer uma parteira preparada. Com relação a isso, estou desesperada.
Escrevo sem que Sua Majestade o saiba, mas não posso suportar que se deixe aqui, por mais tempo, numa casa de todo precária, estas duas inocentes criaturas. É preciso protestar! Suas Majestades não o farão e, sem dizer uma só palavra, deixar-se-iam encerrar no buraco de uma adega, a pão e água, se isso lhes fosse exigido. Em nossa capela, crescem fungos nas paredes e seria impossível ficar nos quartos caso não se mantivesse o fogo aceso nas lareiras. É lógico que nos ajudamos reciprocamente o mais que podemos! Contudo, algumas vezes, temos vontade de desanimar, mas quando vemos com que paciência Suas Majestades suportam tudo isso, também nos resignamos e vamos em frente”.
Ainda na Ilha da Madeira, o Imperador contraiu um grave resfriado que acabou por vitimá-lo fatalmente. O Imperador contava então com a idade de 34 anos e a Imperatriz com a idade de 30, levando o luto por 67 anos.
Da Madeira, a Imperatriz mudou-se para a Espanha e outros países da Europa, onde teria apoio familiar. Após a morte do Imperador Carlos, a Imperatriz viu-se obrigada a assumir a Regência em nome do filho, o Arquiduque Otto. Ainda por este motivo lutou incessantemente tanto no lado social quanto no lado político para o bem da Áustria e Hungria. Na Europa, a Imperatriz Zita recebeu parte dos diretos e rendimentos dos bens confiscados, podendo oferecer o necessário para toda a Família Habsburgo e para os que a acompanhavam, no entanto, a Imperatriz usava a maior parte destes recursos em doações para seu povo, pois a Grande Guerra fez muitos mortos, feridos e órfãos.
Indo para o Canadá, vivendo lá por cerca de 10 anos, hospedada em casa das Irmãs de Santa Joana D’Arc, a Imperatriz percorreu os Estados Unidos em conferências religiosas, numa peregrinação resignada e admirável, com vistas a angariar doações para seu povo. Para tanto teve a ajuda das filhas e da mãe, que auxiliavam na separação, classificação e empacotamento das doações.
Em 1948, a Imperatriz ganha uma residência de presente dos filhos em Nova York, nesta mesma época os EUA estavam planejando cessar a ajuda enviada a Áustria, ocasião em que a Imperatriz reuniu cerca de 50 esposas de senadores americanos, numa tentativa de expor a realidade de seu povo. A iniciativa surtiu efeito e os EUA mantiveram a ajuda.
Em 1953, Zita retorna a Europa, desta vez para assumir novo compromisso, como sempre de doação e compaixão. Retornou a Europa para cuidar de sua mãe, a Duquesa Maria Antonia que estava bastante idosa, neste período ficando hospedada no Castelo de Berg, residência de sua cunhada e irmão, a Grã-Duquesa Carlota do Luxemburgo e o Príncipe Consorte Felix (seu irmão). Em 1959, a Duquesa Maria Antonia faleceu e a Imperatriz Zita foi proibida de assistir seu sepultamento, ocorrido no Castelo de Puchheim, de propriedade dos Bourbon-Parma, na Alta Áustria.
Após muitos anos em que a providência lhe encaminhou para vários destinos, sempre pela caridade e doação, a Imperatriz sentiu a necessidade de buscar um ponto fixo, uma residência sua, onde pudesse descansar. Escolheu Zizers, no Cantão dos Grisões, na Suíça, perto de todos os centros que lhe detinham especial atenção. Lá tinha uma rotina religiosa intensa: três missas por dia, recitação do terço e orações ao Santo do dia. Recebia visitas e empreendia viagens como à Terra Santa e ao Vaticano e, também, visitas aos filhos.
Em 1982 o Supremo Tribunal de Justiça Administrativa da Áustria revogou o banimento da Imperatriz Zita, concluindo que foram injustos os seus anos de exílio, pois tal banimento era específico para os Habsburgo, a Imperatriz o era apenas por casamento e não por nascimento. Teve então o banimento revogado e retornou a Áustria triunfalmente participando de uma missa com mais de 20.000 expectadores na Catedral de Santo Estevão. Faleceu a 14 de março de 1989, já sem visão e com reduzida mobilidade, quando ela mesma afirmava esperar serenamente sua morte para ir ao encontro do marido.
Assim foi a vida deste casal já santo nos corações de seu povo e nos de muitos fieis por todo o mundo. É de se destacar toda a vida e obra de Carlos e Zita, que mesmo depois da morte foram inseparáveis.
O processo de beatificação do Imperador Carlos iniciou-se em 1949, sendo beatificado, por S.S. o Papa João Paulo II em 2004, tendo o Brasil contribuído circunstancialmente para tanto, pois foi em solo brasileiro em que se deu o primeiro milagre comprovado do Beato Carlos. Atribui-se a ele a cura da Irmã Maria Zita Gradowska, vicentina polonesa, radicada no Brasil desde 1927. Vítima de grave enfermidade nas pernas, tendo desde muito jovem procurado a cura através de médicos e tratamentos, só a teve em 1960, por milagre do Beato Carlos.
A Imperatriz Zita teve seu processo de beatificação aberto em 2009, podendo, desde então, ser chamada de Serva de Deus.
Missas foram celebrados no Rio de Janeiro e em São Paulo, bem como na Áustria e demais países onde há significativa concentração de fiéis, pelos 100 anos do casamento. E como muito bem disse o Abade Emérito do Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro, Dom José Palmeiro Mendes, que celebrou Santa Missa por esta intenção, citando a antífona da comunhão: “bem-aventurados os corações puros, porque verão a Deus. Bem-aventurados os que constroem a paz, porque serão chamados filhos de Deus. Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino do céu”. Palavras que muito bem traduzem a passagem do Imperador Carlos e da Imperatriz Zita pela terra.
Para a divulgação em prol da canonização do Beato Carlos da Áustria foi composto o sítio eletrônico http://emperorcharles.org/Portuguese/steps.shtml e pela beatificação da Serva de Deus Zita o sítio http://www.beatification-imperatrice-zita.org/pages/portugues/fotografias.php.
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