Tiradentes, um dos mais graves enganos da História
Por Otto de Alencar de Sá-Pereira*
Tiradentes: o herói inventado. A república o coloca com Jesus Cristo, lhe dá um feriado e o admira com libertador |
Tiradentes é um dos mais graves enganos da História, contada a partir da república. Há algumas décadas passadas celebrava-se o 21 de abril. Nada mais justo: descobrimento do Brasil: Agora não. O 21 de abril passou há um dia qualquer desapercebido de comemoração, fazendo o povo esquecer-se da data. E aí passou-se a celebrar o 22 de abril de abril: Tiradentes! Mas, por que Tiradentes? O Império tivera, em sua história, muitos ícones a comemorar. Além de D. Pedro I, de D. Pedro II, de D. Leopoldina, de D. Amélia, de D. Thereza Christina e da Princesa Isabel, o Império tivera Caxias, Osório, Tamandaré, Barroso, Porto Alegre, Zacarias de Góes e Vasconcellos, Paraná, Paulo Barbosa, Ouro Preto, Alencar, Castro Alves, Amoedo, Gonçalves Dias, Silveira Martins, Ferreira Viana, Carlos Gomes, Mena Barreto, Pirajá, etc. etc. etc.
A
República precisava também de um ícone. Deodoro... nem pensar! Arrependera-se
de ter proclamado a República e era amigo do Imperador. Floriano Peixoto? Credo
em Cruz! Mandou passar a fio da espada, 400 guardas-marinha da Esquadra
Imperial, na Revolta da Armada. Prudente de Morais? Não. Chacinou Antônio
Conselheiro e todos de Canudos. Campos Salles? Rodrigues Alves? Affonso Penna?
Não poderiam servir. Antes da República, eram Conselheiros do Império. Barão do
Rio Branco? Como um ícone da República pode ser um Barão? Jamais. Santos
Dumont? Era amigo íntimo da Família Imperial no exílio de Paris. Oswaldo Cruz?
Foi um grande médico, sanitarista, do período republicano, mas discípulo de
outro médico, o Barão de Motta Maia, que acompanhou a Família Imperial, no
exílio.
Marechal Rondon? Talvez, mas tinha sangue e
cara de índio! Washington Luís? Foi deposto por Getúlio, não serve também. Quem
sabe, o próprio Getúlio? O homem dos trabalhadores. Mas... como, ícone de uma
República que se diz liberal e democrática... um ditador? Amigo de Hitler, de
Mussolini e de Plínio Salgado, que, por sinal, traiu? Juscelino? Fez Brasília!
Mas acelerou a inflação e tinha cara de palhaço. Também não serve. Jânio Quadros?
Era louco! Mas, então quem? Não há ninguém? Será possível? Villa-Lobos? Gênio
da música, mas era um boêmio. Não serve. Foram escarafunchar, na História
Colonial, anterior à vinda da Família Rela Portuguesa. Beckman? Não, tem nome
alemão. O Sabino, da Sabinada da Bahia? Não serve, não tem perfil de ícone. Os
mais antigos? Duarte Coelho, Tomé de Souza, Duarte da Costa, Mem de Sá?
Não
podem! Foram nomeados pelo Rei de Portugal e eram seus súditos fiéis. Então,
quem? Havia um alferes (sub-oficial) em Ouro Preto, que foi patriota de fato.
Participou da conjuração Mineira de 1789 (conhecida como Inconfidência Mineira)
que queria a independência de Minas Gerais, da Coroa Portuguesa, e era
republicano, e foi o único que se declarou, de fato, revolucionário, enquanto
os outros negaram, em Tribunal. Os outros eram importantes, Padres, Juízes,
desembargadores, poetas famosos, Coronéis, outros oficiais, etc...etc... Mas
todos, ou se mataram na prisão (como Alvarenga Peixoto) ou traíram seus ideais
negando sua participação na Inconfidência. Tanto que a pena de morte foi
reformada em exílio perpétuo para a África (que não foi perpétuo, pois 33 anos
depois, D. Pedro I proclamava a independência (não só de Minas, mas do Brasil
todo) e eles puderam voltar (alguns voltaram já no tempo de D. João VI). Nenhum
deles, portanto, serve de ícone republicano, mas e o alferes? Não é muito
insignificante? Ainda mais que nas horas vagas era barbeiro, e como, costume da
época, também arrancava dentes: “Cabelo, barba e dentes”, por favor, e o fulano
sentava-se, corajosamente, na cadeira do “Tiradentes”. É insignificante e
acabou louco, antes de ser enforcado. (Se é que foi, há dúvidas; como era
“masson”, o teriam salvo e trocado por outro, também condenado à morte.
Suspeita-se). É um simples alferes, tirador de dentes. Não faz mal. Nós o
inventamos. Com quem ele precisa parecer-se? Claro! Com Jesus! O mártir da
pátria! Vamos por lhe barbas (os enforcados tinham cabelo e barba raspados,
antes da execução). E criar sua História” Será o Ícone da República, já que não
há nenhum outro. Foi um patriota republicano. Haverá dúvida? Mas por que não
agiu como os demais, tirando o corpo fora? Terá sido mesmo como patriota? Ou
como irresponsável, por causa da loucura?
A conjuração, antes de ser descoberta pelas
autoridades da coroa-portuguesa, ia de vento em popa, embora com tão poucos
partícipes, que podiam reunir-se na sala do poeta Tomaz Antônio Gonzaga (o
Dirceu da Marília). Todos eram homens de estatura alta, ou da política ou
intelectual, ou militar, etc. entre os de pequena estatura, contava-se Joaquim
José da Silva Xavier, o alferes, tiradentes. Era jovem, robusto e patriota
(pelo menos parecia ser), logo, a figura indicada para ir, de viagem ao Rio de
Janeiro, a fim de encontrar aderentes à Inconfidência. Foi mandado, quase como
um moleque de recados. Como não tivesse muita instrução, nem tino político, ou
lábia publicitária, fracassou. Todas as portas que visitou no Rio de Janeiro,
lhe foram fechadas, ou melhor ainda, lhe eram batidas na cara. Fora! Não
queremos nada com você! Fruto da revolução lá dos franceses; fora! E foram
tantos os foras, que o já fraco equilíbrio psíquico do Tiradentes, tornou-se em
loucura. Voltou para Ouro Preto, ou vila Rica, como também era chamada a
capital da capitania. A volta foi mais dura que a vinda, pois se na vinda
sofrera as agruras de viajante daquele tempo, pelo menos havia a esperança! À
volta, teve as mesmas agruras, mas sem a esperança. E a falta da esperança
aumentou a insanidês. Pousava em fazendas, do caminho. E nas casas-grandes dos
fazendeiros, (em geral ligadas ao Marquês de Barbacena, governador das Minas
Gerais), contava, à mesa, que tropas do Rio de Janeiro marchariam, em breve,
para engrossar os exércitos de revolucionários de Ouro Preto, que a França e os
Estados Unidos enviariam esquadras, para combater o Vice-Rei, no Rio de
Janeiro, impedindo-o de ajudar o Barbacena. E assim por diante. Em cada parada,
até Ouro Preto, aumentavam seus delírios. Resultado: O Marquês de Barbacena
ficou sabendo de tudo, antes mesmo que o traidor Silvério dos Reis, lhe
contasse. Por isso não deu guarida ao Silvério e mandou prendê-lo também.
Também, porque, mal Tiradentes chegou a Ouro Preto foi encarcerado, junto com
todos os outros inconfidentes, que ele havia delatado, na mais pura ingenuidade
dos insensatos e loucos! Como já dissemos foram todos a Tribunal, e negaram;
menos ele. O processo chegou a Lisboa e o Alto Tribunal da Corte, condenou
todos à pena máxima: forca! Mas reinava em Portugal uma mulher, a Rainha D. Maria
I, que ainda não tinha perdido suas faculdades mentais. E como mulher e bondosa
católica reformou a sentença de morte, para degredo em Angola, menos para
Tiradentes, que havia confessado o crime de lesa majestade. (Dizem que mais
tarde, D. Maria I, melhor informada da insanidade de Tiradentes, reformara
também sua sentença, para degredo, mas a reforma da sentença, teria chegado
tardiamente, pois Tiradentes já tinha sido enforcado).
O
Ícone da República, o alferes Tiradentes, é uma figura tão paradoxal, quanto à
própria conjuração que se pavoneou do título de Inconfidência. Que não
conhecendo bem o latim, não entendeu porque a Coroa Portuguesa chamara o
movimento de Inconfidência. Porque “Inconfidere”, em latim é o contrário de
“Fidere”. “Fidere é confiar”; inconfidere” é desconfiar. Ou melhor:
desconfia-se de quem é traidor, inconfidente: Traidores da Coroa. Até hoje,
infelizmente, em Ouro Preto , na Praça, Central, sobre o portal da Casa da
Câmara está escrito “Museu da Inconfidência” ou seja: “Museu da Traição”.
*o autor é advogado, professor e historiador
de renome, membro de diversas instituições culturais, como a Instituto
Histórico de Petrópolis. Monarquista, serviu, como assessor, o Chefe da Casa
Imperial do Brasil, o Príncipe Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança.
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